De acordo com os dicionários, apêndice é um anexo a uma parte principal. No caso do nosso corpo, há um apêndice ao intestino, que normalmente apenas é lembrado quando sofremos com as crises de apendicite aguda, o que significa que ele está inflamado. Apesar de não se saber ao certo qual a função desse órgão, dados estatísticos mostram que 7% a 8% da população pode apresentar sintomas de uma inflamação, que, se não forem tratados, pode ser prejudicial ao próprio intestino grosso, e até mesmo levar a óbito.
Porém , se esse órgão é silencioso, fica no “canto dele”, mais especificamente, na parte inferior direita do abdômen, por que ele pode incomodar tanta gente? “Geralmente ocorre pela impactação de um pedaço de fezes ou corpo estranho (caroço de frutas ou legume) no orifício que comunica o apêndice com o intestino grosso”, explica Ricardo Fittipaldi, gastroenterologista e membro titular da Federação Brasileira de gastroenterologia (FBG). Em casos mais raros, a presença de um tumor também pode causar obstrução. dessa forma, secreções produzidas por ele ficam presas, e se tronam a oportunidade perfeita para que diversas bactérias se instalem, o que causa sua inflamação.
Problema de todas as idades
É mais comum que o problema se manifeste entre jovens e adultos. “A apendicite é predominante na faixa etária entre 15 e 50 anos, mas pode ocorrer nos limites etários, ou seja, em crianças e idosos”, define Cinara Martins de Oliveira, gastroenterologista da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Uma particularidade dessa doença é que ela se relaciona à alimentação ruim: alguns estudos mostram que, em regiões onde a população tem uma dieta balanceada, o problema é menos incidente.
A única opção é operar. “O que muda é o tipo de abordagem. O consenso atual é o da eleição da videolaparoscopia (cirurgia minimamente invasiva)”, diz Renato simão, gastroenterologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP). Não há como evitar o problema, mas um diagnóstico precoce pode prevenir complicações. Por isso, é importante ficar atento aos sintomas para não confundir com algum outro tipo de enfermidade. Confira a seguir os principais sinais que indicam que o apêndice terá uma crise aguda:
1 – Dor
Ela é um dos sinais mais comuns. O apêndice está na parte debaixo do abdômen, no lado direito. Porém o desconforto pode começar na região superior do estômago ou perto do umbigo. Este último ponto se manifesta em 60% dos casos, de acordo com a gastroenterologista Cinara. Inicialmente a dor não é tão severa: “a intensidade, nas fases iniciais, é geralmente leve”, considera Simão. Este cenário faz com que o paciente não dê atenção ao problema e demore para procurar ajuda.
2 – Perda de apetite
É um sintoma inicial muito comum, e está associado a dores abdominais perto do umbigo ou na boca do estômago, está aí um indício de que o problema todo é no apêndice, mas muitas pessoas nem imaginam essa possibilidade. Esses dois juntos são os primeiros sintomas, por isso é importante estar atento a eles e evitar a automedicação, mascarando a dor.
3 – Febre baixa
Um quadro inflamatório pode elevar a temperatura do corpo. “À medida que surgem as complicações, pode se elevar bastante, mas ter febre alta no início do quadro é pouco frequente”, ensina Simão. Não há uma temperatura padrão, mas em geral não vai passar de 38ºC. Porém, se há dor abdominal e febre, mesmo que baixa, é o suficiente para procurar o médico.
4 – Gases e desconforto
“O intestino delgado é muito sensível à inflamação. Com isso, a movimentação diminui e favorece o acúmulo de gases”, explica Cinara. E o paciente acredita ser algo normal. “É frequente rotulara a apendicite como ‘má digestão’, ou associá-la a cólicas intestinais. Ele toma antiespasmódicos, mas a dor persiste”, relata Simão. Se a dor mudar da boca do estômago para o lado direito do abdômen, procure um médico.
5 – Dor na descompressão
A região pode ficar dolorida quando se descomprime o local se comparar a quando você aperta a região. É um exame comum para fazer o diagnóstico. “Isso denuncia inflamação do peritônio, onde o apêndice é lançado contra ele, após a descompressão, e a dor se manifesta”, descreve Cinara.
6 – Náuseas e vômitos
Esses sintomas são menos comuns, mas podem aparecer em algumas pessoas. Isoladamente, podem indicar muitas outras doenças além da apendicite, e não são sinais decisivos para o diagnóstico. Porém, sempre que eles estão associados a dores abdominais e febre baixa, devem ser levados a sério e um médico deve ser procurado.
7 – Diarreia
Esse sintoma quase nunca aparece em adultos, já que o mais comum é que o intestino para de funcionar. Porém, ele é muito frequente em crianças! “Isso ocorre quando há um processo inflamatório intenso da mucosa do intestino, e não isoladamente do apêndice”, conta Cinara de Oliveira. Por isso mesmo, pode ocorrer uma confusão entre a apendicite em crianças e outras infecções intestinais.
Complicações pela demora
Sempre que uma dor abdominal aparece, é muito importante entender as características dessa dor e procurar um médico. Uma apendicite não tratada, por exemplo, pode acarretar diversos problemas: “a demora no diagnóstico ou o não tratamento podem levar a um quadro infeccioso grave podendo culminar com a perfuração do apêndice e evolução para a chamada sepse abdominal, isto é, uma contaminação da cavidade abdominal com fezes, que é a forma mais grave de infecção, colocando a vida do paciente em risco”, descreve a especialista Cinara. Muitas vezes, o intestino acaba sendo tão prejudicado que partes dele também são retirados com o apêndice.
Afinal, para que serve o apêndice?
Dizem por aí que ele não tem uma função definida, por isso mesmo é facilmente retirado quando apresenta alguma inflamação. Será? Na verdade, a ciência ainda investiga a sua funcionalidade. Uma questão é fato: ele está repleto de células de defesa, e provavelmente já serviu como ajudante do sistema imunológico, evidencia Fittipaldi. Já o médico simão acredita que ele ainda seja importante nesse aspecto e em outros. “estudos recentes mostram que o apêndice é um fiel depositário de bactérias benignas da flora normal do intestino grosso, e ajuda na repovoação desta flora em caso de necessidade”, acrescenta o especialista.
Como é a cirurgia?
O único tratamento para a apendicite é cirúrgica (a apendicectomia), para a retirada do apêndice. O procedimento é relativamente simples, mas deve ser realizado o quanto antes, pois a apendicite pode por em risco a vida do paciente.
A cirurgia (sob anestesia geral) deve ser realizada assim que o diagnóstico for feito, e o mais rápido que for possível. Se o indivíduo demorar muito para procurar um médico, a inflamação e a infecção aumenta o risco de complicações. O procedimento demora cerca de 30 a 60 minutos nos casos de fase inicial, e nos casos mais graves o tempo dependerá do procedimento associado a ser realizado.
É possível fazer a cirurgia do apêndice através de incisões mínimas do lado direito do abdômen. Atualmente, dispomos também da cirurgia laparoscópica que apresenta algumas vantagens sobre a cirurgia convencional.
Uma nova técnica (usada desde 2010) para a cirurgia de apendicite permite a retirada do órgão pelo umbigo sem deixar cicatriz. O procedimento é feito com uma só incisão e é mais simples do que a videolaparoscopia tradicional – com três orifícios – ou mesmo do que as chamadas cirurgias de porta única, mais recentes, feitas com apenas uma incisão, mas que usam equipamentos específicos. “Além de ser minimamente invasiva, a técnica é simples e barata. Pode ser feita em larga escala”, diz o cirurgião Sylvio Avilla, do Hospital Infantil Pequeno Príncipe, em Curitiba. A cirurgia é uma mistura entre a videolaparoscopia e a operação tradicional. “Fazemos a incisão de aproximadamente dois centímetros dentro do umbigo e o apêndice é puxado para fora da barriga. A extração é externa, como no procedimento tradicional”, explica o cirurgião pediátrico.
A técnica é feita por uma única incisão na cicatriz umbilical do paciente, e este é suficiente para realizar todo o procedimento; diferente da laparoscopia, que são necessárias várias punções para a retirada do apêndice. Essa técnica exige do cirurgião um aprendizado específico, sendo que poucos médicos estão habituados com esse método no Brasil.
A laparoscopia permite uma recuperação mais rápida, mas não está indicada para todos os casos de apendicite. Em casos de ruptura do apêndice ou naqueles casos em que houve disseminação da infecção para além do apêndice, a laparoscopia não está indicada. Nesse caso, uma cirurgia abdominal aberta (5 a 10 cm) permite ao cirurgião limpar a cavidade abdominal. O tempo médio de permanência no hospital após a cirurgia é de um a dois dias. O retorno às atividades diárias pode ocorrer após 7 a 10 dias.
Portanto, podemos concluir que a evolução da apendicite pode ser muito complicada se não diagnosticada e operada logo, havendo risco de morte nos casos mais graves. Por isso, em consideração a este fato é preferível eliminar o mal pela raiz o quanto antes e sem hesitação, sendo a cirurgia o único tratamento para essa doença. Graças às modernas técnicas cirúrgicas o paciente pode voltar à vida normal rapidamente, quando tratado antes de aparecerem complicações.
O que posso fazer para ajudar na recuperação após a cirurgia?
- Evite atividades físicas extenuantes. Se o seu apêndice foi removido por laparoscopia, evite atividades físicas nos primeiros 3 a 5 dias após o procedimento. Em caso de cirurgia abdominal aberta, limite as atividades físicas durante 10 a 14 dias depois da cirurgia. Pergunte ao médico quando você poderá voltar às suas atividades rotineiras.
- Coloque um travesseiro na barriga e faça pressão leve no abdome antes de tossir, rir ou fazer movimentos bruscos para evitar dor no local da cirurgia.
- Ligue para o seu médico em caso de dor não controlada pelos analgésicos prescritos. Sentir dor aumenta o estresse no organismo e torna lento a recuperação.
- Movimente-se quando estiver se sentindo pronto para isso. Comece devagar a aumentar as atividades quando se sentir bem, faça caminhadas em ritmo lento e vá acelerando aos poucos.
- Durma quando se sentir cansado. Enquanto o seu corpo se recupera, você pode sentir mais sono que o habitual. Acalme-se e descanse quando precisar.
- Converse com o seu médico sobre o retorno ao trabalho ou à escola. Crianças podem retornar para a escola cerca de uma semana após a cirurgia. O retorno ao trabalho depende das atividades exercidas e deve ser orientado por um cirurgião.
- Exercícios físicos como musculação, esportes competitivos e corrida devem ser evitados por 2 a 4 semanas após a ato cirúrgico.
A apendicite pode ser prevenida?
Não há maneira de prevenir uma apendicite. Entretanto, a apendicite é menos comum em pessoas que têm uma dieta rica em fibras, com ingestão de frutas frescas e vegetais.
Quais são as complicações de uma apendicite?
- Ruptura do apêndice: Caso ocorra uma ruptura no apêndice, o conteúdo intestinal e os microorganismos infectantes podem se espalhar para a cavidade abdominal causando uma infecção grave, conhecida por peritonite.
- Formação de abscesso: Quando um abscesso é formado, este requer tratamento antes que cause disseminação da infecção para a cavidade abdominal.
O que é peritonite?
É a inflamação do peritônio, mucosa que reveste toda a cavidade abdominal. No passado, quando o processo infeccioso da apendicite havia se disseminado pela cavidade peritonial, o cirurgião era obrigado a fazer uma incisão grande no abdômen. Hoje, essa abertura tornou-se desnecessária porque a abordagem laparoscópica bem feita permite limpar toda a cavidade através dos três pequenos furos.
Se o diagnóstico é precoce e a cirurgia feita a tempo, a apendicite é uma doença contornável e a recuperação é tranquila. Mas e as complicações?
Sob certas circunstâncias, é preciso retirar parte do intestino, porque o organismo tenta circunscrever a infecção às custas de um bloqueio realizado com os próprios órgãos, que começam a aderir uns aos outros. Nesses casos, a abordagem cirúrgica é muito mais complexa. Por outro lado, às vezes, uma apendicite aparentemente tranquila pode reverter em complicações graves no pós-operatório.
Quais as vantagens da abordagem por via laparoscópica?
A laparoscopia permite ver toda a cavidade abdominal e excluir eventuais doenças associadas ou doenças que nada tem a ver com o apêndice. Essa é uma vantagem, já que na cirurgia feita por um pequeno orifício, muitas vezes, é preciso localizar o apêndice sem vê-lo e, por manobras digitais, trazê-lo para fora.
Vantagem ainda maior da abordagem laparoscópica usufruem os pacientes obesos com infecção da gordura subcutânea e os pacientes com peritonite generalizada. Nesses casos, a cirurgia convencional só poderia ser realizada através de uma incisão muito maior.
Por último, trata-se de um procedimento com boa margem de segurança. Por três pequenos orifícios no abdômen, o paciente fica livre do problema.
Quando devo me comunicar com o médico após uma apendicectomia?Sempre que surgirem:
- Vômitos incontroláveis.
- Piora da dor abdominal.
- Vertigem ou fraqueza.
- Presença de sangue nos vômitos ou na urina.
- Febre.
- Presença de pus na cicatriz cirúrgica.
- Ou sempre que precisar esclarecer alguma dúvida sobre o procedimento ou sobre o que você está sentindo.
No caso de abcesso como a apendicite é tratada?
Nos casos em que houve formação de abscesso no apêndice inflamado, podem ser necessários dois procedimentos, um para drenar o pus e os líquidos do abscesso formado e uma segunda intervenção para remover o apêndice algumas semanas após o controle da infecção. Os antibióticos são prescritos antes da cirurgia para evitar uma peritonite.
Esse tipo de inflamação ocorre mais em que faixa de idade?
A apendicite acomete mais os indivíduos na segunda década de vida, entre os 10 e os 20 poucos anos. Isso não quer dizer que a doença não possa ocorrer nas crianças e nas pessoas mais idosas.
Existe alguma razão para a doença ser mais frequente na segunda década de vida?
Existe. A principal causa para a obstrução da luz do apêndice é a proliferação dos folículos linfoides, pequenos agrupamentos linfáticos cheios de glóbulos brancos, que se localizam na abertura do órgão. Sabemos que, na segunda década da vida, esses folículos são produzidos em maior número e com maior frequência. Esse aumento de volume leva à obstrução do orifício ostioapendicular que resulta no processo infeccioso e de estase (Parada da circulação de um líquido orgânico) característico da apendicite.
Quanto a dor, é sempre localizada na fossa ilíaca direita?
Habitualmente, a dor começa na porção alta do abdômen, com frequência na boca do estômago e, depois de algumas horas, passa para uma área mais baixa à direita do abdômen.
Quais são as principais características dessa dor?
É uma dor pontual, forte, contínua e bem localizada. No entanto, se o tratamento não for adequado, pode transformar-se em dor generalizada, o que indica comprometimento de toda a cavidade abdominal pelo processo infeccioso.
A dor já começa bastante forte?
Começa mais fraca e não necessariamente localizada. Aos poucos, porém, vai aumentando de intensidade e atinge um ponto determinado na fossa ilíaca direita do abdômen. Quando isso acontece, é bom as pessoas estarem avisadas de que precisam procurar auxílio médico com urgência.
Essa dor interfere no funcionamento do aparelho digestivo?
Normalmente, os indivíduos perdem o apetite e a evolução do quadro provoca certa paralisia dos movimentos peristálticos. Como consequência, o paciente apresenta distensão abdominal, náuseas e vômitos.
O intestino continua funcionando?
O intestino perde os movimentos e o indivíduo para de eliminar gases e de evacuar, evidências de um colapso do tubo digestivo.
Quanto tempo costuma levar desde o aparecimento dos primeiros sintomas até a instalação de um quadro mais grave?
Algumas horas. Por isso, se a pessoa sentir dor forte do lado direito do abdômen e achar que é apendicite, deve procurar auxílio médico logo, porque de um dia para o outro um quadro restrito e localizado pode tornar-se generalizado e acometer todo o abdômen.
fontes: lersaude.com.br/apendicite-tudo-o-que-voce-queria-saber//por Natasha Franco / Saúde / Viva Saúde / Ed. 136 / Dr. Ricardo Fittipaldi, Gastroenterologista da Clínica Endogástrico Med Service
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