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terça-feira, 10 de dezembro de 2013
SALVE O PLANETA, SALVE SUA PELE
Cultive sangue bom
Muita gente sobrevive a uma leucemia, ou a um linfoma, graças a uma pequena flor rosa e a micro-organismos habitantes do chão. Uma das quimioterapias que aplaca esses males se chama ABVD. É um coquetel dos medicamentos adriamicina, bleomicina, vimblastina e dacarbazina. O “A” e o “B” derivam de bactérias da natureza – uma linhagem desenvolvida a partir de uma amostra de solo do terreno de um castelo italiano do século 13. O “V” tem origem na flor Catharanthus roseus, ou maria-sem-vergonha, nativa de Madagascar (África). Nos anos 1950, pesquisadores de uma grande empresa farmacêutica começaram a estudar propriedades dela. Um dos resultados foi a criação do remédio, a vimblastina, que ajuda a devolver a vida a pessoas com cânceres até então rotineiramente fatais.
Muitas dessas pessoas com quem conversei na apuração desta reportagem contaram que são eternamente gratas aos médicos e à indústria. Pouquíssimas disseram “Caramba, a natureza acabou de salvar minha vida!”. Talvez porque costumamos subestimar o meio ambiente. Ele faz grandes coisas pelo homem o tempo todo – sim, mesmo quando nossa saúde está perfeita.
Exemplo: muito do ar de que precisamos vem da Prochlorococcus, bactéria desconhecida até 1986. Ela vive nos oceanos e é um dos organismos mais abundantes no planeta – um mililitro de superfície do mar pode ser casa de 100 mil Prochlorococcus. Ainda bem. Essa bactéria produz cerca de 20% do oxigênio do mundo. As plantas e mais micro-organismos fazem os outros 80%.
Procrie, ou apenas transe, sem problemas
Tomando cerveja com um amigo numa noite qualquer, eu me queixava sobre a resposta das pessoas a uma pesquisa britânica que pedia a definição de biodiversidade. Muitas falaram: “É uma marca de sabão em pó!”. Biodiversidade refere-se ao número de diferentes plantas e animais que vivem em uma região. Mas a palavra também se transformou numa espécie de abreviatura ligada à saúde de todo o planeta – e à sua. E o prognóstico não é bom.
Por causa da superpopulação humana, do desmatamento desenfreado, do uso excessivo de combustíveis fósseis e mais indisciplinas do homem, espécies estão desaparecendo num ritmo ocorrido pela última vez há 65 milhões de anos: a era catastrófica em que os dinossauros foram extintos. “Muito deprimente”, respondeu meu amigo. “Se quer mesmo que os homens se importem com a biodiversidade, diga que ela ajuda a viver mais e a transar sem problemas.” O que é verdade.
No Brasil, o câncer de testículo assola cerca de 8.300 pessoas por ano, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca). Felizmente, já é um dos tipos de câncer mais curáveis. Ponto para a natureza! Sessões de quimioterapia contra esse mal contam com três potentes medicamentos. Um é a cisplatina, derivada do metal platina. A bleomicina é feita a partir de uma bactéria. O etopósido vem de raízes de uma planta do Himalaia, a Podophyllum hexandrum, ou himalayan mayapple. Antes de usar esse trio, os médicos conseguiam curar apenas 10% dos casos de câncer de testículo. Hoje, a chance de sobrevivência é de 70%, em média.
Sim, o futuro da vida na terra e a possibilidade de sexo esta noite podem ser proposições intimamente relacionadas. Há não muito tempo, fui visitar um mercado de remédios tradicionais em Durban (África do Sul). Meu guia era Jabulani Dhlamini. Enquanto me mostrava algumas ervas, ele contou que anos atrás fora até a Universidade de KwaZulu-Natal com um saco de lascas das raízes de uma planta forrageira que diziam curar impotência masculina. O nome científico desse vegetal é Eriosema kraussianum, mas em Zulu tem mais poesia: chama-se bangalala.
Os químicos da universidade isolaram cinco compostos da planta, submetendo-os a testes no tecido peniano de coelhos. Uma das substâncias apresentou 75% da eficácia do sildenafil, princípio ativo de muitos remédios para impotência. A biodiversidade também nos oferece sexo melhor.
TENHA UMA CORAÇÃO FORTE
A natureza ainda merece ilustre crédito pelas impressionantes melhorias em nosso bem-estar cardiovascular. Segundo o Ministério da Saúde, entre 1996 e 2006 caiu em 20,5% o número de pessoas que falecem por doenças cardiovasculares – a principal causa de morte no Brasil. Uma víbora e um fungo influenciaram muito essa boa estatística.
No Japão e na Inglaterra, pesquisadores começaram a criar a classe de medicamentos chamados estatinas nos anos 70. Desenvolvidas a partir de fungos (parentes dos que nos deram o antibiótico penicilina), as estatinas revelaram notável capacidade de derrubar o nível de colesterol ruim (LDL) em nosso organismo – e ele é um dos grandes responsáveis pelo entupimento de artérias. Logo, aqueles fungos proporcionaram menos infartos e derrames: o uso das estatinas aumentou nos anos 90.
Mas o upgrade na saúde cardiovascular do homem também é cortesia da jararaca, serpente brasileira e uma das mais perigosas da América do Sul. O veneno dela provoca queda acentuada e repentina na pressão sanguínea, descobriram cientistas do Brasil na década de 40. A arma da jararaca age na angiotensina, composto presente no sangue que eleva a pressão. Daí nasceu outra importante classe de medicamentos: os inibidores ECA (têm efeitos na enzima de conversão de angiotensina). São altamente eficazes contra hipertensão e insuficiência cardíaca.
MANTENHA A FORMA
Está surpreso? Tem mais. Poderia imaginar que um caracol do Oceano Pacífico, o Conus magnus, nos daria um analgésico, a ômega-conotoxina, que não possui os efeitos viciantes da morfina e é mil vezes mais potente? E que uma espécie de pinheiro da Costa do Pacífico, o Taxus brevifolia, renderia uma substância, a paclitaxel, que ajuda a combater câncer de seio e ovário, e mostra-se promissora no tratamento do câncer de próstata? Pois rolou. E muito mais virá por aí – se o homem prezar mais a biodiversidade, claro.
“Precisamos seguir na investigação dos micróbios que estão em todos os lugares, inclusive em nosso corpo, e que nos mantêm saudáveis”, disse-me Daniel Gruner, ecologista da Universidade de Maryland (EUA). “Com a ajuda de análises genéticas, estamos começando a identificá-los e entender como funcionam.” Pessoas obesas, por exemplo, tendem a possuir maior proporção de um grupo bacteriano altamente eficiente em extrair nutrientes dos alimentos. Isso talvez ajude a explicar por que sujeitos com sobrepeso podem investir numa dieta igual à dos amigos mais magros e não perder quilos com facilidade. Entender a biodiversidade nesse nível, e aprender a manipulá-la, dá aos médicos mais uma ferramenta para nos manter saudáveis – e em forma.
DÊ SAÚDE ÀS GERAÇÕES
Estima-se que cerca de 400 mil espécies de planta habitam a Terra, além de um número não calculado de insetos, invertebrados marinhos, fungos e bactérias, cada um equipado com algum arsenal químico. “Examinamos apenas uma pequena porcentagem de plantas contra um grande número de possíveis doenças”, afirma James S. Miller, vice-presidente de ciência do centro internacional de plantas do Jardim Botânico de Nova York (EUA). Milhões de insetos e outras pequenas espécies mal foram classificados pelos pesquisadores.
“É profunda a nossa dependência das plantas, animais e micróbios em todos os aspectos de nossa sobrevivência”, destaca Gruner. Ele fala com um conhecimento de causa que extrapola o alto credenciamento científico que construiu. Quando tinha 15 anos, o ecologista derrotou uma leucemia – viva aquela pequena flor rosa! Também queremos que a natureza ainda apresente respostas caso nós, nossos filhos, netos, bisnetos, tataranetos precisemos de ajuda para salvar nossas vidas. Certo? Faça o que puder para preservar a Terra. Sempre.
BOLDO: As folhas podem deter crescimento de melanomas, segundo estudo italiano. Faça um chá com elas. Ponha três folhas em uma xícara (chá) e, em seguida, jogue água fervente. Se quiser amenizar o gosto amargo, adicione na xícara um cravo ou uma fatia de gengibre.
CURCUMINA: Componente do açafrão-da-índia, é poderoso anti-inflamatório, segundo relatório no periódico Alternative Medicine Review (EUA). Pode retardar o crescimento de vários tipos de câncer. Espalhe meia colher (sopa) de açafrão-da-índia no peixe ou no frango.
UNHA-DE-GATO: Tome chá dessa planta – você acha em lojas de produtos naturais. De acordo com estudo da Universidade da Carolina do Norte (EUA), unha-de-gato pode retardar a decomposição do colágeno nas juntas. Na América do Sul, ainda é usada para combater febres e úlceras.
FONTE: MENSHEALTH
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